Por: António Guterres
Quero em primeiro lugar expressar os meus sinceros agradecimentos ao Juiz Ivo Rosa pelo seu grande empenho na tentativa de fortalecer o nosso sistema judicial.
O seu esforço e a sua disponibilidade convenceram o povo timorense, a sua imparcialidade na tomada de decisões sempre foi aceitável por todos aqueles que querem ver um Timor-leste democrático.
Ivo Rosa acaba de abandonar o cargo que ocupou durante 2 anos em Timor-leste. O juiz português denuncia a interferência política no sistema judicial. “O poder judicial em Timor-Leste não é independente”, critica.
É triste ver a partida de alguém que se disponibilizou para desenvolver a justiça de um país que busca a consolidação da sua democracia. Ivo Rosa foi um dos juízes que reprovou o Orçamento Geral de Estado de 2008, considerando que este era inconstitucional.
Na sequência disto, o português tornou-se um problema para o governo, o qual se serviu deste exemplo para não renovar o contrato com o juiz, libertando-se assim de uma pessoa que poderia tornar-se inconveniente.
Ou seja, o nosso governo acaba de dispensar uma pessoa com valor reconhecido, que poderia fazer muito pela solidificação do nosso sistema judicial. E, ao mesmo tempo, pede ajuda ao governo português para melhorar a justiça em Timor-leste. Afinal, o que é que queremos para o país?
O governo parece não saber muito bem. Parece que olha para o sistema político e para o sistema judicial como duas faces da mesma moeda.
A justiça deve funcionar de modo autónomo. Se assim não for, não estamos a falar de uma verdadeira democracia. Se o sistema judicial for dominado pela política, surgem riscos claros para a sociedade: aumento de corrupção, impunidade e injustiça.
Ora, o governo mostra vontade de arregaçar as mangas e fazer alguma coisa pelo país. A vontade é tanta que os nossos governantes tiveram a ideia de tornar a justiça dependente da política. Uma ideia “engraçada”, mas que é contrária aos interesses do povo.
Resta-nos saber o que vai fazer o governo daqui para a frente. É bom que mantenha esta vontade de trabalhar, mas que acerte de uma vez por todas nas decisões que toma. Se assim não for, não vale a pena falar de “desenvolvimento e estabilidade” em Timor-leste.
Eu sou optimista, mas também realista. Sem justiça não há democracia. E sem democracia não há desenvolvimento. É bom que comecemos a pensar seriamente nisto.